Motores, transmissões, chassis, hidráulica, eletrificação e sistemas de assistência definem a nova geração de tratores.
A Agritechnica 2025, que se realiza em novembro próximo, deverá marcar uma viragem significativa no desenvolvimento tecnológico dos tratores agrícolas. A poucos meses da abertura do certame, vários fabricantes já revelaram inovações e candidaturas aos Agritechnica Innovation Awards, enquanto outros reservam estreias mundiais para o evento em Hannover.
O engenheiro agrícola e industrial Roger J. Stirnimann, da HAFL (Zollikofen, Suíça), elaborou um relatório técnico que sintetiza as principais tendências conhecidas até meados de setembro de 2025. As inovações abrangem todas as áreas do trator moderno — desde os motores de combustão e transmissões, até à hidráulica, eletrificação e automação.
Motores de combustão: a era dos combustíveis alternativos
Com as normas Stage V já consolidadas, a pressão regulatória sobre emissões de óxidos de azoto e partículas deixou de ser o principal motor de inovação. O foco atual deslocou-se para a redução das emissões de CO₂, através da utilização de combustíveis renováveis.
Muitos fabricantes passaram a homologar as suas gamas para operar com biodiesel RME (éster metílico de colza) e HVO (óleo vegetal hidrogenado) — combustíveis conhecidos como drop-in, que podem substituir o gasóleo sem necessidade de alterações técnicas.
Nos bastidores, decorre intensa investigação sobre etanol e hidrogénio. O etanol, apesar da menor densidade energética (21 MJ/l face a 36 MJ/l do gasóleo), é visto como uma alternativa viável em países produtores de cana-de-açúcar e milho, como o Brasil. A Case IH aposta nesse mercado com o Puma 240 Ethanol, equipado com motor N67 de seis cilindros adaptado ao ciclo Otto, derivado da versão a gás natural.
Sistemas periféricos e travagem contínua
Nos motores diesel convencionais, a atenção volta-se agora para os sistemas periféricos. Diversas novas séries de tratores, a apresentar na Agritechnica, incorporam ventiladores reversíveis automáticos, que facilitam a limpeza do radiador e mantêm a eficiência térmica.
Outro campo de evolução é a introdução de travões contínuos sem desgaste, capazes de aumentar o binário de retenção do motor em descidas e proteger os travões de serviço.
A CNH equipou os seus novos tratores europeus com válvulas de descompressão, tecnologia oriunda do sector dos pesados. Ao libertar a pressão de compressão no final do segundo tempo do ciclo, o pistão encontra menor resistência no terceiro tempo, aumentando o binário de travagem.
A Fendt, nas séries 700 Gen7.1 e 800 Gen5, continua a utilizar a geometria variável do turbocompressor (VTG) e acrescenta uma travagem hidráulica auxiliar, em que a bomba hidráulica trabalha contra resistência, convertendo energia cinética em calor.
A marca alemã expande ainda o sistema automático de limpeza do filtro de ar do motor, agora também aplicado ao filtro de cabine. A nova série 1000 Gen4 mantém o motor MAN D26 de 12,4 litros, mas todos os modelos passam a dispor de DynamicPerformance, com acréscimo de potência até 550 cv. O modo AdaptivePower permite selecionar curvas de potência equivalentes a modelos inferiores, reduzindo consumo e protegendo os implementos.
Transmissões e chassis: a era do controlo total
Com o lançamento da nova série 500 Gen4, a Fendt estende o conceito VarioDrive — tração integral permanente até 25 km/h — a toda a gama, dos 500 aos 1000.
A CNH apresenta transmissões continuamente variáveis (CVT) de nova geração, com três gamas de avanço e uma de marcha-atrás (3/1), para os T7 SWB de curta distância entre eixos. A caixa CVT maior, com quatro gamas de avanço e duas de marcha-atrás (4/2), foi adaptada para tratores de alta potência.
A JCB muda de fornecedor e equipa os novos Fastrac 6000 com transmissões ZF e motores FPT, substituindo os componentes anteriormente fornecidos pela AGCO.
Entre as inovações mais notáveis destaca-se o conceito Line Traction LT3, desenvolvido pela AEBI Schmidt em parceria com a Müller. Instalada no TERRATRAC, esta tecnologia elimina os diferenciais longitudinais e transversais, mantendo a rotação idêntica em todas as rodas. O controlo hidrostático ajusta automaticamente a velocidade de cada roda em curva, otimizando tração, reduzindo danos no solo e aumentando a segurança em declives.
O desenvolvimento do chassis também ganha atenção: fabricantes como a Claas e a McCormick incluem de fábrica sistemas de regulação da pressão dos pneus e lubrificação centralizada dos eixos dianteiros, enquanto a CNH passa a utilizar suspensões independentes com travões de disco integrados.
O sistema Advanced Vehicle Suspension coordena a suspensão dianteira e da cabine com a amortização ativa do engate traseiro, melhorando conforto e estabilidade.
Hidráulica inteligente e circuitos independentes
Nos tratores de grande potência, a tendência passa por dois circuitos hidráulicos independentes, cada um com bomba de deslocamento variável. Um circuito destina-se a consumidores contínuos (como semeadores pneumáticos), enquanto o outro alimenta funções intermitentes (cilindros de chassis ou marcadores de linha).
Os sistemas de load-sensing (LS) evoluem agora para versões eletrónicas (e-LS), que ajustam a pressão da bomba com maior precisão e rapidez. A Fendt já integra este sistema nas gamas 500 Gen4, 600, 700 e 800, e a ROPA lançou a primeira máquina compatível — a colhedora de batata Keiler II RK22.
A ligação e-LS connect, desenvolvida em conjunto entre a Fendt e a ROPA, permite comunicação digital via ISOBUS, eliminando a necessidade de cabos LS físicos.
Eletrificação: um avanço inevitável
Os tratores totalmente elétricos estão a chegar ao mercado, embora ainda enfrentem custos elevados. As baterias duplicam o preço de aquisição face aos modelos diesel, mas prometem menores custos operacionais.
A chinesa ZSHX Advanced Tractors prepara o XEEVO E904i, com dois motores elétricos (66/90 kW), bateria LFP de 105 kWh e carregamento rápido em uma hora, a um preço aproximado de 100 mil euros.
A John Deere apresentará um modelo de 130 cv elétrico, desenvolvido de raiz para propulsão elétrica e condução autónoma, com sensores câmara/LiDAR e comando “by-wire”. Equipado com até cinco baterias NCM de 39 kWh (total de 195 kWh e 800 V), dispõe de motores independentes para tração, TDP e bomba hidráulica, além de outros quatro motores auxiliares para ventilação, climatização e gestão térmica.
Startups como ONOX e TADUS também avançam. A primeira desenvolve tratores modulares de 50 a 100 kW, com baterias substituíveis, enquanto a segunda regressa à Agritechnica com um novo modelo de 100 kW elétrico e arquitetura de tração distribuída.
A TAFE (Índia) apresenta o EVX 75 Hybrid, combinando motor diesel de 55 kW com dois motores elétricos e bateria de 25 kWh. Já a Zoomlion (China) aposta em transmissões elétricas para tratores de até 400 cv, integrando dois motores coaxiais que podem operar de forma independente ou conjunta.
Cabines e sistemas de assistência: a inteligência no comando
A Claas lança o sistema Adaptive Drive Train Management, que analisa curvas de eficiência do motor, transmissão e hidráulica. A função Auto Load Anticipation memoriza as variações de carga nas cabeceiras de campo e ajusta automaticamente o regime do motor e a relação da caixa antes das oscilações de esforço, evitando o “engasgar” e otimizando o consumo.
A Deutz-Fahr apresenta o ADAS (Advanced Driver Assistance System) para as suas novas séries de seis cilindros. Este pacote inclui aviso de saída de faixa, assistência em curva, deteção de pessoas e objetos, e, na versão avançada, cruise control adaptativo e reconhecimento de sinais de trânsito.
O sistema considera variáveis específicas da agricultura, como a presença de implementos dianteiros e traseiros, a ausência de marcações em estradas secundárias e o acompanhamento próximo de colhedoras.
A Lindner introduz o SmartLift2 no novo Lintrac 160 LDrive, otimizando automaticamente a direção nas quatro rodas, o comportamento hidráulico e a transmissão durante o uso do carregador frontal.
Novos sistemas de travagem de reboque inteligente detetam empuxo em descidas e aplicam automaticamente até 2 bar de pressão pneumática, aumentando a segurança em transporte.
Agritechnica 2025, vem aí uma nova era tecnológica
A Agritechnica 2025 confirma a transição dos tratores para uma nova era tecnológica, onde mecânica, eletrónica e digitalização convergem para maior eficiência, segurança e sustentabilidade.
O futuro passa por tratores multifuncionais, eletrificados e conectados, capazes de comunicar com implementos e infraestruturas agrícolas, reduzindo consumos e simplificando a gestão no terreno.
A agricultura do século XXI já não depende apenas de potência e tração — depende, sobretudo, de inteligência técnica e integração de sistemas.